Cidade aumentou seu contingente populacional em 5,8%; Veja ranking
Produtora de alho, cana e, consequentemente, de cachaça, com pequenas fábricas da bebida em seu território, a cidade de Brotas de Macaúbas, na microrregião da Chapada Diamantina, a 613 km de Salvador, é destaque na Bahia em 2021. Não por causa do sabor da sua cana ou da qualidade do alho. É que o município, entre os 417 em todo estado, é o que mais cresceu em contingente populacional neste ano, com uma variação de 5,8%, de acordo com as Estimativas das Populações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A cidade de Luís Eduardo Magalhães, segunda colocada, e Camaçari, que ostenta a terceira posição, têm, respectivamente, crescimento de 2,78% e 1,61%. No contexto estadual, a Bahia apresenta um crescimento de 0,37% e continua como o quarto estado mais populoso do Brasil, atrás de São Paulo, líder do ranking, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Para o estado, a evolução em número populacional é tímida, quase imperceptível. Só que para Brotas de Macaúbas, que tinha 10.130 moradores no fim de 2020 e, agora, tem 10.705, o crescimento é visível e tem razões de ser.
Anexamento de povoados
De acordo com a Prefeitura, o ponto crucial para esse avanço em densidade populacional tem relação direta com a redução de moradores em Barra do Mendes, que foi a terceira cidade que mais diminuiu na Bahia, perdendo 5,10% das pessoas que moravam lá.
“O crescimento está atrelado à decisão judicial que envolve Brotas e Barra do Mendes. É por isso também que uma cidade é a que mais ganha, enquanto a outra é a que mais perdeu. Foi um ganho de causa decretado pelo STF para Brotas, que trouxe de volta comunidades que pertenciam à nossa cidade e estavam sendo contabilizadas para Barra do Mendes. Essas comunidades foram reanexadas e estão contando nessa projeção do IBGE”, explica a prefeitura em nota.
A decisão citada pela gestão se trata de um julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4621 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que, com unanimidade, julgou procedente o pedido de retorno dos povoados de Boca das Palmeiras e Santo André para Brotas.
Dos tempos do coronelismo
A briga pelas comunidades tem origem no fim do século XIX, quando as terras eram disputadas por coronéis, como conta Wanderley Rosa, pesquisador em história da região.
De acordo com ele, na região que era conhecida como Chapada Velha – primeiro lugar onde encontraram diamantes na Bahia -, havia duas famílias poderosas: Matos e Coelho. Rivais que protagonizaram um conflito que começou entre os coronéis Clementino de Matos e Militão Rodrigues Coelho e se intensificou ao longo dos anos. Rosa explica que o auge da desavença foi a insurgência do coronel Militão, em 1912.
“Naquele ano, a oposição na Bahia ganhou a eleição e o coronel Militão, que estava indicado pra ser o intendente de Brotas pela posição, acabou não sendo e Brotas apoiou aquele governo que foi ao poder. Por isso, em 1914, Militão invadiu Brotas e conseguiu ser nomeado intendente do município”, lembra.
Depois da invasão, o historiador afirma que a cidade virou uma praça de guerra. Nesse meio tempo, Barra do Mendes foi emancipada, mas isso não durou muito tempo. “Em 1917, por ocasião da revolução sertaneja, Horácio de Matos e outros coronéis resolveram retomar o poder. Depois disso, o Governo fez acordo com eles para, dentre outras coisas, encerrar a emancipação do município de Barra do Mendes, que voltou a ser anexado a Brotas”, fala Rosa, ressaltando que Barra só foi emancipada definitivamente por volta de 1950.
Com a emancipação definitiva no meio do século passado, por conta da proximidade com Barra do Mendes, comunidades começaram a deixar de pertencer a Brotas e passaram a ser de Barra e outros lugares como Seabra por estarem a mais de 100 km de Brotas. Esse fato seria o precedente para que Barra do Mendes conseguisse, junto à Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA), anexar as comunidades de Boca das Palmeiras e Santo André.
“Só que, ao contrário de outras comunidades, essas duas não aceitaram a migração. Na época, estavam fazendo a remarcação dos municípios e o Governo Estado aceitou, mas o povo de Boca das Palmeiras nunca se sentiu de Barra. É uma sensação de pertencimento, tradição, que decisão judicial não muda”, declara Juraci de Souza, liderança da comunidade Boca das Palmeiras.
Presidente da associação comunitária de mandiocultura de Boca, Juraci explica como a comunidade ficou com a decisão. “Para nós, do grande ao pequeno, foi como se tivesse ganhado na loteria, uma alegria enorme, Somos de Brotas, não importa que é longe. Lá a gente é bem recebido, lá temos mais atenção e já fomos muito humilhados por Barra”, conta ele, que destaca o papel de Brotas no apoio ao cultivo da mandioca que sustenta toda a comunidade.
Se o Barra e Boca nunca se acertaram e a relação política é problemática, por que anexar a comunidade? Wanderley Rosa afirma que o motivo seria o repasse que o município recebia do Governo quando tinha as duas comunidades. “É simples, é pelo aumento de fundo de participação dos municípios. Sem os dois, Barra do Mendes sai de uma alíquota de renda de 1,0 para 0,8 no fundo por conta da perda dessas comunidades”, declara.
Bom filho à casa torna
A prefeitura de Brotas acrescenta ainda mais uma razão para essa tendência de aumento. “Acreditamos que há um retorno de pessoas que estavam em grandes centros para cidades menores. E Brotas tem recebido de volta muitos filhos que, antes, tinham ido trabalhar em São Paulo, Goiânia e outras capitais, e voltaram a se fixar por aqui”, escreve.
Ainda de acordo com a administração municipal, a volta dos filhos pródigos não é um fenômeno que se inaugura em 2021. Por lá, desde 2010 que o povo tem voltado para casa, desistindo da vida nas metrópoles e voltando para um município que tem 70% da sua população situada em zona rural. O fenômeno acontece desde 2010. Antes daquele ano, a cidade só perdia cidadãos que deixavam o município em busca de oportunidades
Um exemplo desses filhos que retornam é o recepcionista Maicon de Oliveira, 21 anos, que voltou para a cidade em 2017 depois de morar por anos no povoado de Alvorada. “Eu sou nascido aqui e fui ainda pequeno pra Alvorada. Só voltei há quatro anos atrás porque tinha oportunidade de emprego e, como tava tudo certo pra entrar no serviço, não quis perder a chance”, explica ele.
E os impactos desses anos de retorno de pessoas como Maicon já estão sendo vistos por quem reside no município. De acordo com a prefeitura, não há uma pesquisa e nem um dado específico sobre isso, mas é notável o número de novas casas que estão impulsionando a construção civil por lá e, em paralelo, aumentando até o número de ruas que estão distribuídas pela área urbana de Brotas. Questionada sobre a quantidade de novas ruas, a Secretaria de Obras Públicas de Brotas disse não saber informar o quantitativo pelo fato de diversas ruas ainda não terem registro no sistema da cidade.
Wendel de Novais*