Defesa recorreu ao STJ após TJ negar pedido de habeas corpus. No dia da sua prisão, Paulo Galo afirmou que participou do ato com objetivo de abrir o debate sobre a existência do monumento. Bandeirantes como Borba Gato desbravaram territórios no interior do país e capturaram e escravizaram indígenas e negros.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, revogou nesta quinta-feira (5) a prisão temporária do entregador Paulo Roberto da Silva Lima, Paulo Galo, de 32 anos, um dos três suspeitos de incendiar a estátua do Borba Gato, na Zona Sul de São Paulo. O ataque ao monumento que homenageia o bandeirante paulista ocorreu no dia 24 de julho.
- Borba Gato: veja livros e filmes para entender a história dele e dos bandeirantes
- Monumento a Mariguella é coberto com tinta vermelha, e Escadão Marielle Franco, pichado
Paulo está preso desde o dia 28 de julho, quando se apresentou espontaneamente à delegacia e admitiu participação no protesto contra a estátua que homenageia Borba Gato. Os manifestantes decidiram atear fogo nela para abrir o debate sobre a existência do monumento. A ação foi filmada e as imagens acabaram sendo divulgadas nas redes sociais (veja vídeo abaixo).
Bandeirantes como Borba Gato desbravaram territórios no interior do país e capturaram e escravizaram indígenas e negros. Segundo historiadores, muitos mataram índios em confrontos que acabaram por dizimar etnias. Também estupraram e traficaram mulheres indígenas
“Para aqueles que dizem que a gente precisa ir por meios democráticos, o objetivo do ato foi abrir o debate. Agora, as pessoas decidem se elas querem uma estátua de 13 metros de altura de um genocida e abusador de mulheres”, chegou a escrever Paulo numa rede social, antes da prisão.
A defesa do suspeito considera que a prisão foi política, “fundada da criminalização de movimentos sociais”. Seus advogados recorreram ao STJ depois que o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou no domingo (1º) o pedido de liberdade para Paulo.
No pedido de habeas corpus enviado ao Superior Tribunal de Justiça, os advogados destacam que o ativista não possui antecedentes criminais, não praticou ações violentas e colaborou com as investigações
A expectativa da defesa é que seu cliente seja solto ainda nesta quinta. Ele está detido na carceragem do 2º Distrito Policial (DP), no Bom Retiro, Centro da capital. A investigação do caso é feita pelo 11º DP, Santo Amaro.
Até a última atualização desta reportagem a Secretaria da Segurança Pública (SSP) não havia confirmado se o inquérito da Polícia Civil sobre o caso foi concluído e se também a investigação decidiu pedir a prisão preventiva dos três suspeitos, que já tinham sido indiciados pelos crimes de incêndio da estátua do Borba Gato, dano, associação criminosa e adulteração de veículo.
3 suspeitos
Após a revogação pelo STJ, o advogado de defesa de Paulo, André Lozano, afirmou que “qualquer argumento para decretação da prisão preventiva se demonstra incabível e ilegal”. Ele também é o advogado de Danilo Silva de Oliveira, o Biu, de 36 anos, outro suspeito de ter ateado fogo na estátua.
Danilo também chegou a se apresentar com Paulo à polícia, mas negou que tivesse ateado fogo no monumento. Admitiu, porém, ter ajudado a descarregar os pneus que foram queimados depois em volta da estátua.
Além de Paulo e Danilo, a polícia indiciou o motorista Thiago Vieira Zem, de 35 anos, pelo ataque ao monumento de Borba Gato. Ele chegou a ficar preso, mas foi solto no mesmo dia por decisão da Justiça. Procurada pelo G1, a advogada Carla Knoth Rôla Teixeira, que defende o suspeito, não quis comentar o assunto.
Incêndio
A estrutura da estátua de Borba Gato foi atingida pelas chamas, mas não ficou comprometida, segundo análise preliminar da Defesa Civil. Bombeiros apagaram o fogo. Ninguém ficou ferido.
Ao analisar as imagens, a investigação conseguiu identificar a placa do caminhão usado para levar os pneus. O veículo tinha a placa adulterada.
Em 25 de julho, os policiais localizaram o motorista do caminhão, Thiago. Ele também foi preso e solto provisoriamente no mesmo dia.
Em depoimento à polícia ele afirmou que é dono do veículo e que cobrou R$ 500 de frete para transportar mais de 200 pneus até o local em frente a estátua, mas que não sabia o que aconteceria.
No dia 26 de julho, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), lamentou o episódio e disse que um empresário se propôs a doar o valor necessário para restaurar a estátua.
Em 30 de julho, a vereadora de São Paulo Luana Alves (PSOL) propôs a substituição da estátua do bandeirante Borba Gato por uma de Tereza de Benguela, líder quilombola do século 18.
No dia 31 de julho, um grupo de lideranças conservadoras do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) fez a limpeza simbólica do monumento do Borba Gato.
A Guarda Civil Metropolitana (GCM) informou que irá aumentar o número de rondas pela Praça Augusto Tortorelo de Araújo, onde fica a estátua de Borba Gato.
Outros protestos
Esta não foi a primeira vez em que a estátua na Zona Sul de São Paulo foi alvo de protestos. Em 2020, crânios foram colocados ao lado de monumentos de bandeirantes para ressignificar a história de São Paulo.
Alguns projetos de lei pedem a proibição ou a retirada de monumentos que homenageiam figuras como a de Borba Gato.
As propostas têm como objetivo principal estabelecer uma política pública de combate ao racismo por meio do reconhecimento do papel que figuras históricas tiveram na prática escravagista.
Há discussões na Câmara dos Vereadores da capital, na Assembleia Legislativa do estado e na Câmara dos Deputados, mas em nenhuma dessas casas legislativas os projetos foram votados ainda.
Por Kleber Tomaz e Beatriz Backes, G1 SP e TV Globo — São Paulo