Em 2011, alguns municípios da região sofreram com a maior tragédia climática da história do Brasil. Na época, uma CPI da Alerj fez 42 recomendações para evitar novas catástrofes naturais na região. Segundo o deputado Luiz Paulo, presidente do colegiado, pouca coisa foi feita.
Sérgio Cabral, Pezão, Francisco Dornelles, Wilson Witzel e Claudio Castro. Em 11 anos, o Rio de Janeiro teve cinco governadores e nenhum deles conseguiu desenvolver e colocar em prática um plano de prevenção eficiente para evitar que as chuvas que frequentemente caem na Região Serrana se tornassem grandes tragédias nacionais.
O ano de 2011 marcou a maior catástrofe climática da história do Brasil, quando uma forte chuva devastou vários municípios da região e deixou mais de 900 mortos e quase 100 desaparecidos na Região Serrana. Na opinião de especialistas ouvidos pelo g1, pouco foi feito para resolver questões determinantes como:
- recuperação de encostas;
- reflorestamento das margens dos rios;
- demolições de casas em locais de risco;
- realocação de moradores que vivem em terrenos instáveis.
Na avaliação de geógrafos, ações como essas poderiam reduzir os danos causados por chuvas como a da última terça-feira (15) em Petrópolis. Até a última atualização desta reportagem, passava de 100 o total de pessoas mortas por conta da forte chuva que caiu no município.
Diante de pelo menos 54 casas destruídas, ruas devastadas e centenas de desabrigados, a Prefeitura de Petrópolis decretou estado de calamidade pública.
O cenário de destruição na cidade é parecido com a devastação que o município sofreu em 2013. Na ocasião, 33 pessoas morreram.
Ações emergenciais
A cada nova tragédia na Região Serrana do Rio de Janeiro a mobilização de políticos é praticamente imediata. No entanto, o passado mostra que a maioria das ações são de caráter emergencial, para amenizar os problemas já causados e não para evitar novas tragédias.
Isso aconteceu em junho de 2011, quando a então presidente Dilma Rousseff assinou um chamamento público para a construção de 6.874 empreendimentos na região (6.641 unidades habitacionais, 188 unidades comerciais e 45 industriais), além de contratos para a recuperação e reconstrução de pontes e contenção de encostas das áreas afetadas. O objetivo era recuperar o que havia sido destruído.
Já em 2013, Dilma voltou a oferecer um repasse emergencial para Petrópolis no valor de R$ 12 milhões. Na ocasião, além do valor emergencial, a cidade necessitava de R$ 100 milhões para uma nova reconstrução.
Em 2018, a cidade de Petrópolis lançou um plano para a redução de riscos, com um estudo que mapeou 234 áreas mais vulneráveis a enchentes e deslizamentos. O trabalho recomendou o reassentamento de mais de 7 mil famílias (7.177) que vivem em áreas de alto risco.
Em 2019, o então governador Wilson Witzel e a secretária de estado do Ambiente e Sustentabilidade, Ana Lúcia Santoro, anunciaram a retomada do Programa Limpa Rio, que seria aplicado em todo o estado, com investimentos de R$ 43,5 milhões.
De acordo com o anúncio feito na época, os rios Piabanha e Quitandinha, em Petrópolis, seriam prioridade no investimento.
Na opinião de Marcelo Motta, professor do Departamento de Geografia e Meio Ambiente da PUC-Rio, as autoridades sabem o que precisa ser feito, mas falta vontade política.
“A gente deveria ter tomado atitudes muito severas dado a fragilidade desse sítios. São sítios urbanos muito frágeis e com um crescimento populacional também muito agudo. A questão é que parou de chover e esses eventos extremos, eles têm recorrência de dez anos, o último foi em 2013, 2011 antes. Nesse intervalo, parece que se esquece dessa política pública“, comentou.
“É o que eu chamo de amnésia do céu azul. O céu fica azul, esquece de se fazer a política que é necessária. E com isso vai sucateamento de defesa civil, sucateamento das políticas, né, de intervenção das obras e a gente tem o quadro que tem”, concluiu o professor.
Para o professor do departamento de geografia da UFRJ, Antônio Guerra, não faltam pessoas qualificadas para reduzir os danos que essas chuvas podem causar. Segundo ele, falta vontade política.
“Existem recursos humanos, tanto nas prefeituras quanto nas universidades, o que falta é vontade política para que a prefeitura realmente proceda de uma forma integrada. Mesmo que você não acabe totalmente com o problema, pelo menos você minimiza os seus efeitos. Que você não tenha mortes”, comentou Guerra.
CPI fez recomendações
Na opinião do deputado Luiz Paulo (Cidadania), presidente da CPI da Alerj que investigou a atuação dos órgãos públicos diante da tragédia de 2011, o trabalho de recuperação dessas cidades é urgente. Contudo, segundo ele, é fundamental garantir um investimento continuo para que o problema não volte a acontecer ano após ano.
“É necessário construir habitações de interesse social, fazer obras de contenção de encosta, reflorestamento, tirar pessoas das margens do rios, de terrenos instáveis, que moram em talvegues. Isso tem que ser ano após ano, em uma ação continuada, que envolva os executivos do estado, das prefeituras e da União. Se não for assim vai chegar mais um evento extremo na Região Serrana e a população é que vai sofrer”, comentou Luiz Paulo.
Depois de ouvir dezenas de especialistas, secretários e prefeitos da região, o relatório final da CPI presidida por Luiz Paulo em 2011 indicou 42 recomendações para evitar novas catástrofes naturais. Segundo o parlamentar, onze anos depois muito pouco foi colocado em prática.
Propostas da CPI:
- Criar um Centro de Prevenção de Catástrofes no Estado do Rio de Janeiro;
- Recomendar às Câmaras Municipais para que façam leis definindo os talvegues como áreas não edificandi;
- Solicitar aos Poderes Executivos a decretação de Utilidade Pública para fins de desapropriação as áreas de risco tornando-as não edificando;
- Indicar às prefeituras para que elaborem programa de desocupação das áreas de risco e de preservação ambiental;
- Fazer Emenda Constitucional obrigando os municípios a implantarem efetivamente a Defesa Civil Municipal;
- Fazer Emenda Constitucional determinando que todos os municípios elaborem Planejamento Estratégico e planos de contingência;
- Elaborar Lei determinando que nos municípios em Situação de Emergência ou de Calamidade Pública o percentual de 50% do IPVA pertencente ao Estado seja aplicado no próprio município em recuperação das vias e suas obras de arte;
- Propor às instituições financeiras a abertura de linhas de crédito especial para a construção de habitações na região atingida;
Claudio Castro anunciou investimento em 2021
Em uma das poucas ações com caráter preventivo, em janeiro de 2021, o Governo do Rio de Janeiro lançou o programa Governo Presente na Região Serrana.
Durante três dias, o governador Claudio Castro (PSC) trabalhou na região, como uma forma de marcar os 10 anos da tragédia de 2011. Castro anunciou, ao lado dos secretários, investimentos de mais de R$ 500 milhões, que deveriam ir para a prevenção de acidentes ao bem-estar da população.
O governador prometeu investir R$ 135 milhões, ao longo de 2021, em obras de recuperação de encostas em Nova Friburgo e em Teresópolis. Na ocasião, o Governo informou que aplicaria mais R$ 220 milhões em serviços de desassoreamento e canalização de rios, além da urbanização de margens.
Nesta quarta-feira (16), durante coletiva de imprensa em Petrópolis, o governador confirmou que até o momento foi gasto R$ 200 milhões com a limpeza de rios e R$ 80 milhões na contenção de encostas. Castro também disse que o trabalho do governo tem que ser voltado para a prevenção.
“Somente no ano passado, nós gastamos mais de R$ 200 milhões limpando rios em 31 municípios. Gastamos R$ 80 milhões em contenção de encostas. O estado é muito grande e temos um passivo enorme. Não se resolve tudo em 4 anos. É necessário que se faça o preventivo, mas leva tempo. Não dá pra fazer tudo de uma vez só”, explicou Claudio Castro.
Questionada pela reportagem, o Governo do Estado do Rio de Janeiro não informou sobre o andamento das obras que ainda não foram concluídas.
Por André Trigueiro e Raoni Alves, TV Globo e g1 Rio